domingo, 23 de março de 2014

Reflexões e Práticas Pedagógicas no Ensino de Língua Estrangeira





Este é o último texto dos quatro sobre o terceiro volume de Entornos e Contornos, da Editora CNA.

O quarto eixo temático do livro é Reflexões e Práticas Pedagógicas no Ensino de Língua Estrangeira, o qual, dentre todos os eixos temáticos do livro, é o mais útil para a leitura daqueles que se dedicam ao ensino de línguas estrangeiras.

O tema foi abordado em sete artigos: O ensino comunicativo e o foco na forma, de Flávio Amorim da Rocha; Reflexões sobre a compreensão oral em Língua Estrangeira, de Eliane Tiyoko Nishimori Sato; Leitura em sala de aula de Língua Estrangeira: uma reflexão teórico-prática, de Ivandra Catarina Walker; Material autentico: el “mundo real” dentro del aula, de Nora Inés Di Pacce; Descripción y efectos de sentido em el uso de algunos pronombres dativos em español, de Enrique Luis Melone; Jogos como instrumento pedagógico no ensino de inglês, de Cristiane Koga e Giovana Silva Zanzini; e O discurso atual de alunos de inglês – Uma leitura que extrapola a sala de aula, de Renata Pucci.

O ensino comunicativo e o foco na forma trata de um assunto que há muitos anos, quando a abordagem comunicativa do ensino de línguas estrangeiras surgiu, começou a tomar conta dos espaços para reflexões quanto ao ensino de línguas: ensinar ou não gramática de forma explícita?

Segundo o artigo, alguns pesquisadores que suportam a abordagem comunicativa acreditam que ensinar gramática de forma explícita quebraria o fluxo em sala de aula que acreditam ser comunicativo. Outros pesquisadores ressaltam que sem conhecimento teórico acerca da gramática da língua, os alunos se distanciam da correção gramatical nos enunciados que produzem.

Flavio Amorim da Rocha traz para dentro dessa discussão que há tanto tempo vem incomodando os professores, principalmente os que utilizam a abordagem comunicativa, a seguinte citação de Fotos e Ellis (1999): “O conhecimento implícito se refere ao conhecimento intuitivo e processual. Não está, conscientemente, disponível aos aprendizes. Os falantes nativos, por exemplo, não conseguem, normalmente, descrever as regras que usam para construir suas frases”.

Com isso, o autor deixa uma luz para os professores inquietos acerca do tema: levar os alunos a deduzir o que está implícito nos enunciados abordados, ou seja, utilizar uma abordagem dedutiva no ensino de gramática.

Reflexões sobre a compreensão oral em Língua Estrangeira vai de encontro ao assunto do artigo anterior, visto que lembra que a compreensão oral envolve outros conhecimentos, como sintático, semântico, lexical, discursivo e sonoro.

A autora ressalta a importância da compreensão oral, pois é a partir da interação oral que o ser humano se constitui enquanto pessoa; é por meio da interação social que o ser humano aprende o que já existe e introduz o novo na sociedade; é partir dessa interação que ele se define.

Dessa forma, nota-se a importância do conhecimento de mundo na compreensão oral, contudo há outros recursos que também auxiliam nesse processo, como os recursos visuais.

Os profissionais que estão iniciando sua carreira no ensino de línguas estrangeiras encontrarão nesse artigo, sem dúvida, reflexões importantíssimas para nortear sua prática pedagógica; lembrando que a visão que o professor possui de língua influencia fortemente sua maneira de ensinar.

Ao contrário de toda a importância dedicada à fala no artigo anterior, o terceiro artigo do livro já afirma, em seu início, que a leitura é a habilidade linguística que se faz mais útil no contexto em que vive o aluno brasileiro, visto que ela é requerida nos vestibulares, concursos públicos, meio acadêmico e navegação na internet, dentre outros suportes.

No entanto, a autora também apresenta a relação dialógica que permeia a leitura, afinal, a interação entre os sujeitos não é exclusiva da habilidade da fala.

Na leitura, o autor dialoga com o leitor por meio da carga pessoal que imprime no seu texto e o leitor, por usa vez, emprega seus conhecimentos de mundo, assim como os emprega na compreensão oral, para construir o sentido do texto que lê.

O emprego dos conhecimentos de mundo do leitor no processo de construção de sentido é responsável pelas diferentes interpretações que diferentes leitores podem obter a partir de um mesmo texto ou mesmo as interpretações obtidas não esperadas pelo autor.

Além dessas considerações, a autora faz muitas outras que os professores de língua estrangeira precisam conhecer para desenvolverem atividades de leitura efetivas com suas turmas.

Já o primeiro artigo escrito em espanhol que compõe o quarto eixo temático do livro trata da dificuldade que o professor de línguas tem em escolher materiais autênticos para serem utilizados em sala de aula, dada a grande variedade dos mesmos.

Ao citar as vantagens do uso de materiais autênticos em sala de aula, Nora Inés Di Pacce lembra que isso não se trata de banir o livro de didático do contexto de ensino e aprendizagem de línguas, visto que por ser organizado em unidades temáticas, ele é um importante referencial tanto para professores como alunos. O uso de materiais autênticos, dessa forma, é uma maneira de enriquecer o processo de ensino e aprendizagem.

A autora menciona que os textos dos livros didáticos e a fala do professor são textos com estruturas simples, correção gramatical e focam o uso das estruturas que estão sendo estudadas no momento, ao passo que os textos autênticos enriquecem o contato do aluno com a língua, devido à variedade de situações linguísticas que apresentam.

É sugerido que ao longo da sequencia didática exposta pelo livro, se encontre um espaço para introduzir materiais autênticos, ou mesmo que atividades que estão presentes no livro sejam substituídas por outras com materiais autênticos, afinal, nem tudo que é proposto pelo livro pode ser útil para a realidade da turma em questão.

Entretanto, para que a inserção desses materiais nas aulas dê bons resultados, é importante que se escolha o gênero textual adequado ao que se quer abordar. Além disso, uma verdadeira tarefa comunicativa consiste em levar o aluno a produzir algo.

Por fim, a autora lembra que os gêneros textuais possuem estruturas semelhantes na maioria das línguas, o que pode facilitar a compreensão do aluno, mas, ao mesmo, esse tipo de aula demandará mais tempo de preparação por parte do aluno.

Enrique Luis Melone, em Descripción y efectos de sentido em el uso de algunos pronombres dativos em español, faz uma profunda reflexão teórica sobre um certo tipo de pronome da língua espanhola.

Ela já inicia seu texto mencionando a herança gramatical do latim que o espanhol herdou no que diz respeito ao emprego dos pronomes.

Embora o autor conclua seu texto com uma sequencia didática para a abordagem do tema, esse artigo é mais indicado para aqueles que se interessam pela descrição gramatical do espanhol, ressaltando que esse artigo também mostra as variações de sentido em espanhol devido ao emprego dos pronomes. Dessa forma, fica cada vez mais claro que embora sintaxe e semântica sejam estudos distintos, um depende do outro para sua existência.

Cristiane Koga e Giovana Silva Zanzini, por sua vez, iniciam seu artigo falando das representações mentais que os alunos possuem de uma palavra, as quais são ativadas toda vez que têm contato com essa palavra.

Elas também sustentam as reflexões que irão tecer nos termos de Vygotsky: Desenvolvimento Real (DR), Desenvolvimento Potencial (DP) e Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP).

Toda pessoa que quer ser professor de línguas em escolas de idiomas tem, necessariamente, que saber o que significam esses termos, visto que eles são a base para as relações na sala de aula em torno da construção do conhecimento.

As autoras também mencionam a hipótese do filtro afetivo, de Krasen. Segundo essa hipótese, se o aluno estiver mais receptivo a aula, o filtro, o qual funciona como uma barreira, diminui e o aluno consegue absorver com mais facilidade o que foi abordado em sala.

A partir dessas considerações, as autoras propõem a introdução de atividades no formato de jogos na sala de aula, pois elas aumentam a interação entre os alunos e os deixam mais a vontade e, consequentemente, mais receptíveis ao conhecimento.

Finalmente, o último artigo do livro aborda o discurso dos alunos e professores de língua estrangeira, mais especificamente, daqueles inseridos no contexto de ensino e aprendizagem de língua inglesa.

Esse artigo é marcado por reflexões provenientes de Bakhtin, por isso, é um deleite para aqueles que se interessam por semiótica.

A autora inicia seu texto afirmando, com base em Bakhtin, que não é possível encontrar a língua fora do contexto social, o que já foi mencionado em outros artigos desse eixo temático, mas de formas diferentes.

É por meio da língua que o sujeito se define em relação ao outro. Contudo, nossos discursos trazem em si traços dos discursos dos outros.

Ela ainda diz que a palavra apenas produz sentido se associada ao concreto, ou seja, ao que ela representa na realidade; do contrário, ela não quer dizer nada.

No que diz respeito aos discursos de outrem, ao citar Bakhtin, a autora acrescenta que eles não apenas permeiam nossos discursos, mas é a eles que respondemos, concordando, discordando ou acrescentando algo.

Por fim, ao analisar o discurso de uma professora e sua turma quanto à  importância de se estudar inglês, a autora ainda ressalta que os signos linguísticos são diferentes em cada língua, devido aos discursos que a permeiam.

Enfim, mais uma vez, recomenda-se a leitura do terceiro volume de Entornos e Contornos não apenas aos professores de língua estrangeira, mas também aos coordenadores pedagógicos desse tipo de professor e aos gestores de escolas que ensinam alguma língua estrangeira.

Se esse artigo lhe chamou a atenção, leia também o texto Novas Tecnologias Educacionais e Educação a Distância, que é o primeiro eixo temático do terceiro volume de Entornos e Contornos, disponível em http://aestarepravoopina.blogspot.com.br/2014/03/novas-tecnologias-educacionais-e.html#links, o texto Desafios para Formação e Atuação do Professor de Língua Estrangeira, que é o segundo eixo temático do mesmo livro, disponível em http://aestarepravoopina.blogspot.com.br/2014/03/desafios-para-formacao-e-atuacao-do.html#links e o texto sobre o terceiro eixo temático do livro, Questões Afetivas e Cognitivas Dentro e Além da Sala de Aula, disponível em http://aestarepravoopina.blogspot.com.br/2014/03/questoes-afetivas-e-cognitivas-dentro-e.html#links.



Referências bibliográficas



CARÁ JÚNIOR, Jaime; Silva, Sérgio Luis Monteiro da. (org.) Entornos e Contornos: desafios contemporâneos em contextos de ensino e aprendizagem. Volume 3. São Paulo, Editora CNA, 2010, p. 203-336.



Luciana Estarepravo da Silva

Especialista em Docência da Língua Inglesa e formada em Letras (Português/Inglês)